Review | Demolidor – 1° Temporada (2015)

A Melhor série da Marvel

marvel demolidor

Neste ano de 2025, a série Demolidor, originalmente lançada pela Netflix, completa 10 anos. E com o retorno recente do personagem em Born Again, reacendendo o interesse do público, parece o momento ideal para revisitar a temporada que deu o tom certo desde o início.

Antes do universo Marvel saturar as telas com piadas e explosões, Demolidor chegou mais contido, mais cru. Uma série de herói que parecia menos interessada em salvar o mundo e mais em entender por que alguém continuaria tentando, mesmo quando tudo à sua volta falha. E é exatamente essa abordagem mais pé no chão, mais íntima, que a faz ainda tão relevante dez anos depois.

A cidade como personagem

Existe uma urgência crua no modo como a história é contada, como se a cidade estivesse ruindo a cada episódio e só restasse o instinto — não o de sobrevivência, mas o de fazer a coisa certa mesmo quando ninguém mais liga. Matt Murdock é a tradução disso. Não o herói em glória, não o justiceiro em surto. Só um homem em conflito, cuja fé se equilibra precariamente com a raiva. E é nessa colisão interna que a série encontra o coração dela.

matt murdock

A Nova York que vemos aqui é suja, não é a cidade estilizada nem cômica da Marvel. É um organismo em decomposição. E o olhar da direção, muitas vezes no escuro, nos becos, nos corredores, sabe disso. É uma série noturna. Não só pela estética, mas pela alma. Quase tudo aqui acontece em tons baixos, vozes contidas, olhos pesados. O mundo está cansado. Matt também. E mesmo assim ele levanta.

Charlie Cox é o tipo de ator que entende que o rosto de um personagem também está na forma como ele respira. Seu Demolidor é vulnerável, hesitante, mas nunca fraco. Ele não interpreta coragem como grandiosidade, ele a interpreta como teimosia. E talvez seja isso que faz funcionar tão bem. A série se recusa a supervalorizar o heroísmo. Ser herói, aqui, dói. Demora. E deixa cicatrizes que não desaparecem na próxima cena.

WIlson Fisk é o Melhor Vilão da Marvel

Mas nada disso existiria sem um antagonista à altura, e Vincent D’Onofrio entrega algo monstruoso em Wilson Fisk. Um vilão que parece viver sempre à beira de um colapso emocional, como se fosse explodir a qualquer momento, e às vezes explode. Mas o mais desconcertante é o quanto ele é humano.

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Fisk não é apenas cruel. Ele é vulnerável, quase frágil em certos momentos. Fala com hesitação, ama com intensidade, e reage com violência quando sente que algo ameaça sua ideia de ordem. Sua brutalidade nasce do medo de perder o controle. Ele quer salvar a cidade, não para dominá-la, mas para reconstruí-la à sua imagem. E é nesse desejo sincero que está o veneno.

Há algo quase infantil em Fisk. Nos seus gestos contidos, na forma como fala, na maneira como ama. Ele não é um vilão de opereta, nem um gênio do mal. É um homem ferido tentando se convencer de que ainda pode ser bom, desde que o mundo aceite os termos dele.

Sua relação com Vanessa, por exemplo, não é um alívio romântico. É uma chave. Ela o vê inteiro, e mesmo assim fica. E isso valida tudo o que ele faz. Ou pior: justifica. O amor vira licença.

Estrutura Organizada

A estrutura da temporada respeita o tempo das coisas. Não existe pressa em entregar uniforme, nome de herói ou fan service gratuito. Tudo vem quando tem que vir. O seriado se permite explorar a tensão, o desconforto, a ambiguidade moral. E quando a ação vem, ela é quase sempre brutal. O plano-sequência da luta no corredor (você sabe qual) não é só uma cena bem coreografada. É uma declaração de estilo. A série se posiciona ali. Diz: “é assim que vamos fazer as coisas por aqui”.

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Talvez o mais impressionante seja o quanto a série entende o peso de um trauma. Ninguém aqui é só “do bem” ou “do mal”. Todo mundo está tentando não afundar. Foggy, Karen, Claire... cada um carrega sua rachadura, sua dor particular. E a série escuta essas dores com atenção. Não apenas como pano de fundo para o drama do protagonista, mas como camadas legítimas de um mundo onde todos estão, de algum modo, perdendo.

A direção sabe ser silenciosa. Usa bem o som (ou a ausência dele) para criar presença. O mundo sensorial de Matt é uma oportunidade estética rara, e a série explora isso sem virar truque. O som aqui é personagem. O modo como o Demolidor "vê" o mundo é usado para intensificar o que sentimos, não para explicar. O espectador é convidado a escutar como ele. Sentir como ele. Estar em desvantagem, mas nunca perdido.

A fé como peso, não como resposta

E a fé, sempre a fé. Esse tema costura tudo. Não como lição de moral, mas como peso existencial. Matt acredita em algo. Ele não sabe exatamente o quê. Deus? Justiça? Redenção? Talvez ele só precise acreditar em alguma coisa para continuar. E isso o aproxima da gente. Demolidor não tenta tornar o herói inacessível. Ao contrário. Ela o humaniza até o limite do desconforto. O corpo dele apanha. O espírito dele também.

Os diálogos são densos, mas nunca pedantes. Há uma inteligência sutil no roteiro, que sabe quando calar e quando machucar. E a construção do submundo do crime é eficiente, ainda que sem grandes surpresas. A força não está na originalidade do que é dito, mas na maneira como é dito. O roteiro confia no seu peso emocional. Não subestima quem assiste.

Antítese da Marvel tradicional

A série funciona quase como uma antítese da Marvel colorida do cinema. Aqui, os heróis não voam, não fazem piadas a cada cena de ação, não resolvem tudo com um golpe de martelo. Eles sangram. E o sangue não é fetiche. É consequência. A dor não é espetáculo. É fardo. E isso importa. Porque dá significado. Dá verdade. Dá peso.

E quando o uniforme finalmente aparece (porque claro que aparece) ele não soa como clímax barato. É ritual. É consequência de uma jornada. E talvez nem seja tão bonito. Mas não precisa ser. É funcional. E isso diz muito. A série não quer estilo antes de substância. Ela quer que o que vemos signifique algo. Cada detalhe é costurado a partir de algo mais profundo.

Matt-Murdock-Foggy-Nelson-Daredevil-Marvel

Demolidor é sobre olhar para dentro e descobrir que o que existe ali é feio, doloroso, violento... mas ainda assim vale a pena lutar por isso. Porque é nosso. Porque é humano. Porque se a cidade está desabando, alguém precisa levantar. Mesmo que não veja com os olhos. Mesmo que a fé vacile. Mesmo que não faça sentido nenhum.

Não é só uma série de super-herói. É um estudo de personagem, de cidade, de caos e de moralidade. E talvez seja isso que a torna tão inesquecível. Porque ao fim de tudo, quando os créditos sobem e o sangue seca, sobra só o silêncio. Um silêncio que escuta. E que permanece.


Demolidor - 1° Temporada (2015)


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