Review | Demolidor – 3° Temporada (2018)

O Renascimento da fé

A terceira temporada de Demolidor é, de fato, uma ressurreição. Depois de tropeços na segunda temporada e do tom inconsistente de Defensores, o retorno do personagem resgata o que tornou a primeira temporada tão forte: uma narrativa focada em moralidade e da identidade. Essa não é apenas uma volta, é uma reconstrução completa de um homem que já perdeu tudo.

Queda e isolamento

A temporada começa com Matt Murdock em ruínas. Física, emocional e espiritualmente. Ele sobreviveu ao desabamento no fim de Defensores, mas não sai ileso. Está ferido, escondido, desiludido. Sua fé, um dos pilares que o sustentavam, está quebrada. O Matt que surge no início dessa temporada não é mais o advogado idealista ou o vigilante firme. É um homem em conflito, machucado demais pra seguir como antes, e cético demais pra confiar que há algum plano maior guiando tudo isso.

Esse ponto é essencial: a série investe tempo nesse processo de perda de fé. Não como um artifício, mas como tema central. A ideia de Deus, de propósito, de redenção, tudo isso é colocado em xeque. E o roteiro acerta ao não oferecer respostas fáceis. Matt passa boa parte da temporada negando qualquer vínculo com o que ele era antes. Ele diz a si mesmo que Matt Murdock está morto, e que só o Demolidor importa agora. Mas nem ele acredita totalmente nisso.

A reconstrução da fé

É aí que entra a relação com a Irmã Maggie. Não apenas como figura materna, mesmo antes da revelação, mas como contraponto direto ao cinismo de Matt. Maggie não está ali para consertá-lo, mas para desafiá-lo. Ela não tem a fé cega que Matt espera ouvir. Ela tem fé em meio à dúvida. Em meio ao cansaço. É uma fé que existe mesmo sem garantias. E essa visão, mais pé no chão, acaba sendo uma âncora pra Matt no processo de reconstrução.

Aos poucos, ele volta a olhar pra si não como um símbolo ou como uma arma, mas como um ser humano. E essa transição é trabalhada com cuidado, sem pressa. O retorno do Demolidor aqui não é sobre o uniforme, mas sobre o significado por trás dele. Quem ele é. No que acredita. E o que está disposto a sacrificar por isso.

O renascimento de Fisk

Wilson Fisk também passa por um processo de renascimento. Saído da prisão por meio de um acordo bem arquitetado, ele retorna ao mundo real mais perigoso do que nunca. O que vemos aqui é uma mente fria, estratégica, paciente.

E o mais interessante é como a série apresenta essa ascensão como um espelho do que Matt está vivendo. Enquanto Matt tenta recuperar sua fé, Fisk reconstrói seu poder com base em manipulação e medo. E esse contraste entre os dois nunca foi tão bem explorado quanto aqui. Eles não são apenas inimigos físicos, eles representam formas opostas de ver o mundo e lidar com a dor.

Dex: o reflexo distorcido

Benjamin Poindexter, ou Dex, surge como a distorção mais direta do que Matt representa. Um homem instável, cheio de traumas, tentando desesperadamente parecer funcional. E é justamente essa vulnerabilidade que Fisk explora. Dex é moldado lentamente para se tornar uma arma. Ele começa como um agente respeitado, mas solitário. Termina como uma marionete vestida com o traje do Demolidor, sendo usado para espalhar caos em nome de um símbolo que ele não entende.

Essa escolha narrativa é inteligente porque força Matt a confrontar o que o traje realmente representa. A série coloca o herói contra uma versão corrompida de si mesmo. E nesse embate, não basta ser mais forte. Matt precisa estar certo de quem é. Precisa acreditar em algo. Sem isso, perde o confronto antes mesmo de começar.

Coadjuvantes que sustentam

Ao contrário da segunda temporada, aqui Karen e Foggy não são arrastados por subtramas irrelevantes. Cada um tem um papel que dialoga diretamente com os temas centrais. Karen, por exemplo, lida com o peso de suas decisões passadas, com o sentimento de culpa e a busca por redenção — temas que ecoam fortemente com os dilemas de Matt.

Já Foggy funciona como o contraponto moral, aquele que tenta fazer a coisa certa dentro do sistema. Ele acredita na justiça, mesmo quando tudo parece corrompido. E isso o torna essencial. Não como alívio ou suporte, mas como alguém que segura a linha enquanto Matt decide se ainda acredita em algo.

Esses personagens não orbitam o protagonista. Eles também estão em reconstrução. Também sofrem, se questionam, caem e se levantam. E isso dá força à temporada como um todo.

Justiça, fé e propósito

Talvez o grande mérito da terceira temporada seja justamente amarrar tudo em torno de um tema só: propósito. O que move cada personagem? O que eles acreditam? O que estão dispostos a fazer por isso? A série não tenta complicar a trama com várias pontas soltas. Ela se concentra em desenvolver bem esses arcos. E por isso funciona tão bem.

A ação continua intensa, com sequências impactantes e criativas. O plano-sequência na prisão, por exemplo, é mais do que técnica, é narrativa. Mostra o caos interno de Matt e o descontrole crescente de tudo ao redor. Mas nada disso rouba o foco. Tudo serve à jornada pessoal dos personagens.

Conclusão

A terceira temporada de Demolidor acerta porque não tenta ser algo maior do que precisa ser. Não está preocupada com o universo Marvel, nem com conexões externas. Está interessada em contar uma história de fé, dor, reconstrução e escolha. E faz isso com uma segurança rara.

Matt Murdock começa a temporada como um homem quebrado. Termina como alguém inteiro, não porque recuperou tudo que perdeu, mas porque encontrou um novo sentido. Ele voltou. E agora, acredita de novo, não em um Deus que controla tudo, mas em sua própria capacidade de fazer a diferença.


Demolidor - 3° Temporada (2018)


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